Novas séries policiais: o insosso ‘Unforgettable’, o ótimo ‘Person of Interest’, o desastre ‘Prime Suspect’

Desconcertando as novas séries da temporada norte-americana.

Unforgettable
Ex-policial utiliza sua rara condição de supermemorização para solucionar crimes.

Série típica de ‘caso da semana’, com o personagem principal com uma habilidade (ou personalidade) incomum e que também carrega algum segredo (ou trauma) em sua vida. Estes dois níveis (a capacidade e o seu histórico) se contrabalançam (ou, às vezes, se chocam) para poder responder os percalços do seu trabalho ou o relacionamento com seus colegas. ‘Unforgettable’ segue esse script linha a linha, portanto, por esse lado não há (e nem promete) nenhuma surpresa maior.

Carrie Wells (Poppy Montgomery) foi uma excelente detetive policial, a melhor do seu departamento, por possuir uma condição extremamente rara, na verdade uma doença, de não conseguir esquecer absolutamente nada de sua vida. Cada mínimo detalhe do que acontece ao seu redor fica gravado na sua mente para sempre. Com isso, ela pode fazer relações e encontrar equivalências a partir de minúcias mínimas, impossíveis de serem percebidas para qualquer outra pessoa. Por outro lado, sua mente bloqueou (sua absoluta contradição) os fatos relativos à morte de sua irmã, quando crianças. A obsessão por descobrir ou se lembrar quem é esse assassino custou sua carreira e sua relação amorosa. Anos depois, agora em Nova Iorque, sobrevive de biscates e de jogo de cartas, até que reencontra seu antigo namorado, Detective Al Burns (Dylan Walsh), que foi transferido para a mesma cidade. Voltar a trabalhar com a polícia, como assessora, pode significar retomar o rumo de sua vida novamente.

Devo dizer, antes de mais nada, que gosto (e muito) de séries-caso-da-semana (o pessoal que acompanha seriados têm um nome específico para isso, que me escapa no momento). Gosto de uma estrutura que seja mais ou menos fixa, e que mude somente o desafio proposto para os personagens, se utilizando dos mesmos esquemas já preestabelecidos. Atualmente, não há mais espaço para isso; o que se exige é que haja um maior aprofundamento (e desenvolvimento) psico – histórico – sócio – ecônomico dos personagens e que isso afete as histórias de tal modo que nada fique como foi no começo. Não tenho nada contra essa linha, por certo!, é somente uma espécie de saudosismo de alguma coisa um tanto mais simples.

Esse lance dos dois níveis, como me referi acima, é um modo dos produtores garantirem aos espectadores que os dois esquemas serão mantidos: o ‘caso da semana’ mudará constantemente e, como subsídio para quando o esquema ficar repetitivo ou quadrado, sempre a possibilidade de fortes reviravoltas com a revelação súbita de novos segredos íntimos. Em ‘Monk’ havia a genialidade e o excentrismo do detetive e sua busca pelo assassino de sua mulher. Em ‘House’ a genialidade do doutor e sua rabujice, e os problemas com sua perna. Em ‘Unforgettable’, a supermemória da ex-detetive e a busca pelo assassino da irmã.

Sendo assim, pode-se dizer que ‘Unforgettable’ cumpre suas expectativas mínimas. No episódio piloto, Carrie está em uma espiral sem sentido em sua vida, até que um assassinato é cometido no seu prédio e ela acaba se envolvendo com a força policial comandada pelo seu ex-amante, o qual vê a possibilidade de trazê-la de volta à ativa e, quem sabe, a retomada do relacionamento (com a complicação de que agora ele está com nova namorada).

Boa apresentação dos personagens, bom desenvolvimento de suas aspirações primárias, flashbacks necessários inseridos nos momentos certos, direção simples, sem muitas frescuras (embora exagerem um pouco nos instantes em que Carrie se concentra em sua memória, com trucagens bonitinhas mas desnecessárias dela olhando para si mesmo enquanto se recorda). Os atores estão medianos, sem arroubos nem exageros.

A questão é Poppy Montgomery que está encarando uma atuação principal, depois do bom desempenho que teve como coadjuvante em ‘Desaparecidos’ (Without a Trace). Ela continua simpática, bonita e com ótima presença, mas suas limitações como atriz também ficam mais à mostra.

Assim como o seriado. ‘Unforgettable’ é simpático, dá para assistir numa boa, dá para acompanhar os episódios, sem grande entusiasmo, e sem grandes frustrações.

Person of Interest
Um ex-agente da CIA se alia a um gênio (e milionário) da computação para ajudar a prevenir crimes considerados ‘irrelevantes’ para o governo.

Opa, finalmente uma série que consegue envolver o espectador, com boa dose de ação, um pouco de drama, outro tanto de crítica política, equilibrados com boa produção e roteiros bem amarrados. Nenhuma maravilha da natureza, nada que te faça sofrer desesperado para assistir o novo episódio da semana, mas em vista do que se tem apresentado nesta temporada, até que foi bem.

A premissa do argumento é apresentada com bastante coerência, do tipo que sabemos, com certeza, ser absurdo e inexistente, mas que nos deixa sempre com uma pulga na orelha, pela sua possibilidade latente. Parte-se (mais uma vez!) da paranóia provocada pelos ataques ás Torres Gêmeas e do esforço do governo norte-americano de evitar novos atentados. Nesse sentido, construiu-se um gigantesco computador que reune todas as informações possíveis e imagináveis da metrópole Nova Iorque colhidas através de todos os milhares de pontos espalhados pela cidade: câmeras, gravações, telefonemas e tudo o mais. O responsável pelo projeto, Harold Finch (Michael Emerson), cria os programas que refinam as informações, cruzam os dados e permitem prever, com alta probabilidade de acerto matemático, as situações e as pessoas envolvidas com possíveis novos atentados.

A máquina, no entanto, vai um pouco além, pois não diferencia esses ‘grandes problemas’ dos crimes comuns ocorridos no dia a dia. Para o governo, porém, isso não é interessante, importam somente as grandes conspirações; menos que isso, é tudo considerado como ‘irrelevante’ e descartado. Finch revolta-se com essa atitude, é afastado e considerado morto (de uma forma que saberemos somente mais para adiante). Antes disso, ele tinha podido colocar uma chave de acesso restrito à lista de irrelevantes: para não chamar a atenção do computador e do governo, ele recebe somente a identificação da pessoa que estará envolvida em um crime, sem nem saber se ela será a vítima ou o próprio criminoso. Para ajudar as vítimas e evitar que o crime seja cometido, Finch conta com a ajuda de um ex-agente da CIA, John Reese (Jim Caviezel) atormentado e descrente da vida, a ponto de virar um mendigo e ser também considerado morto. A associação com Finch e a chance de ajudar realmente as pessoas lhe proporciona novo fôlego e um sentido para sua existência.

O roteiro consegue alinhavar os eventos de forma agradável e bem contada, com bons momentos de ação coreografados de modo que até relevamos os eventuais e inevitáveis absurdos (John Reese domina um grupo de mafiosos, explode um carro na exata medida para que capote e não exploda nenhum dos passageiros, prevê todos os movimentos dos adversários… se houvesse mais uns dez John Reese no exército norte-americano, os Estados Unidos já teriam eliminado o tal terrorismo mundial).

A produção e a direção equilibradas mantém o clima de tensão e de correria com bom suspense (os zooms e cliques vistos do ponto de vista das câmeras de segurança espalhadas pela cidade e que sabemos que estão sendo recolhidos e analisados pelo supercomputador aumenta o clima de desconforto com o o big brother onipresente) e também faz com que nos importemos com suas vidas pessoais e queiramos saber mais sobre como e por que acabaram sendo considerados mortos e quais os motivos de terem caido na clandestinidade.

O elo mais fraco nesse contexto fica sendo o da policial Carter (vivida pela carismática Taraji P. Henson) que, por um acaso cruza com o mendigo Reese logo antes dele se associar com Finch e percebe que ele está por trás de uma série de eventos violentos. Sua perseguição ao misterioso justiceiro e sua incompetência de chegar perto dele adquire uns tons de galhofa incômodos.

Os atores estão bem. Michael Emerson está excelente como o genial Finch, de saúde frágil, mas poderoso em sua inteligência e que também carrega seus próprios fantasmas pessoais. John Caviezel traz a mesmíssima cara de coitado que ele pensa ser de angústia mostrada desde o seu ‘Jesus Cristo’. Para alguns críticos isso incomodou muito. Para mim, não atrapalhou em nada: para um ex-agente-da-CIA-durão-com-cara-de-coitado, o que realmente em sã consciência se poderia esperar? Taraji é a mais prejudicada com um personagem inconsistente que não ajuda em nada sua interpretação. Ela até tenta dar um ar sério de policial durona e compenetrada, mas, por exemplo, ela usa uma arma na cintura que tem quase metade do seu tamanho: é impossível não pensar que, em caso de necessidade, a dificuldade em tirar a arma do coltre inviabiliza qualquer participação em um tiroteio.

Os três primeiros episódios (os que assisti) mantém o mesmo padrão. Espero que aumentem o tom daqui pra frente, com melhores histórias e melhor aproveitamento dos casos. Por enquanto, a boa qualidade (não excepcional, mas bem aceitável) faz ter vontade de continuar assistindo.

Prime Suspect
Policial enfrenta o dia a dia pesado das ruas de Nova Iorque, a perseguição a um serial killer, os profundos problemas pessoais e o machismo dos seus colegas.

Não sou contra adaptações ou atualizações de filmes ou séries que deram certo em outros lugares. O problema não é a adaptação em si. É a falta de coragem. De ousadia. No mais das vezes, não se pretende alcançar (quem diria ultrapassar) as qualidades do orignal; a única ambição se limita a querer beber do sucesso alheio. ‘Prime Suspect’ é uma série clássica inglesa que amealhou dezenas de prêmios, provocou intensa discussão sobre a força das mulheres na sociedade, e consolidou a carreira de Helen Mirren. Os argumentos são banais (em geral, serial killers), mas a direção sóbria (tipicamente britânica) valoriza os roteiros excepcionais, as atuações espetaculares. Não à tôa, é um autêntico marco. Querer reproduzir isso implica em aceitar o tamanho da responsabilidade.

Faz tempo que se pretende fazer um remake norte-americano. Maria Bello brigou muito para conseguir esse papel. O clima era de grande ansiedade pelo resultado. Eu não pretendia assistir o piloto. Gosto demais do original e sabia que a maior probabilidade era de frustração. A curiosidade, maldita!, foi bem maior do que minha razão (e o marketing foi bem feito, o trailer foi instigante). Portanto, a minha opinião não é isenta de um preconceito assumido e de um ceticismo incrustado.

O início do primeiro episódio é bom, o que me aliviou deveras. A apresentação faz uma ótima transposição da personagem inglesa da década de 90 passada para uma norte-americana dos dias atuais (perfeita a cena em que Maria Bello, a detetive Jane Timoney, obriga o motorista de táxi a desligar o celular enquanto dirigia), a ambientação de compadrio masculino no departamento onde trabalha, a indignação quando tomam um caso importante que deveria ser dela, a indignação maior ainda quando percebe que estão investigando errado. Até que o detetive responsável pelo caso, ‘líder’ informal do clube machista tem um ataque do coração e morre. Jane assume então, enfrentando a desconfiança ou direta hostilidade dos colegas, persegue um serial killer que ninguém, além dela, acredita existir, tem que tomar conta do pai doente e administrar um divórcio.

E, de repente, ligam o automático. A direção é corrida, as resoluções do roteiro são apressadas e mal resolvidas, os clichês se avolumam, e me irritaram até o mais profundo. O que poderia ser excepcional (ou, pelo menos, interessante) (ou, no mínimo, passável) se perde e vira uma trama rasteira, de ‘caso da semana e vamos partir para outra pois esse episódio já acabou’. E Maria Bello… Qualquer atriz teria um trabalho ingrato para apagar a referência original ou diminuir a comparação (simplesmente inevitável) com Helen Mirren. Maria Bello tomou o papel com muita força e com todas as garras e é bem evidente todo o seu esforço para imprimir autenticidade ao seu personagem. É justamente esse esforço o que mais lhe prejudica, pois o único que consegue é tornar sua Jane patética e irritante, sem estofo.

Como disse, assumo o preconceito. Não deveriam realizar esse remake. Realizaram, então deveria ser espetacular. Não é. Posso dizer que o chapéu que ela usa é bacana. O resto é somente uma espetacular perda de tempo.

 

 

 

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6 Comentários em “Novas séries policiais: o insosso ‘Unforgettable’, o ótimo ‘Person of Interest’, o desastre ‘Prime Suspect’”

  1. JF Says:

    Quer um programa policial sério?
    SOUTHLAND
    Pra quem quer uma série que se aproxima da realidade policial este é o seriado. Esta na 4ª temporada. Mesclando o serviço de policiamento ostensivo de rua e dos detetives. Ambientada em LOS ANGELES.
    Cada episódio começa com o narrador dando uma lição (válida para a vida profissional de qualquer policia) sobre o serviço policial aprendida por algum dos personagens naquele episodio.

    Vale a pena.

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    • Claudinei Vieira Says:

      Concordo, JF. “southland” é ótimo. eu, pessoalmente, cansei um pouco da série depois da segunda temporada, acho que a premissa se esvaziou um pouquinho, o que é inevitável se um seriado continua por muito tempo. mas a qualidade se mantém.

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  2. tb n tenho Says:

    Tem a refilmagem de hawaii 5-0 que esta muito boa!

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  3. Paula Muniz Says:

    Não assisti nenhuma destas novas ainda mas se gosta de serie policiais não pode deixar de assistir NCIS,CRIMINAL MINDS, FLASHPOINTque o primeiro capitulo é ridiculo mas a partir do segundo vocÊ não consegue mais parar de assistir!!!

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    • Claudinei Vieira Says:

      Paula, o post é mesmo sobre as novas séries. Das atuais, inclusive algumas que já acabaram, acompanho várias, a maioria do meu gênero preferido que é mesmo o policial. embora não tenha nenhuma que seja minha paixão fanática, como um dia foi pra mim o Arquivo X. Posso citar algumas mais regulares, como The Closer, Lei e Ordem e suas spin-offs (menos a de Miami, que foi um desastre), O CSI gostava muito, até a saída do Grissom, depois ficou chatinha (e detesto as spin-offs), The Mentalist, Castle, White Collar (estas três muito simpáticas, embora extremamente irregulares). Das que você citou, não consegui gostar do Criminal Minds, assisti a primeira temporada e um pouco da segunda e nunca me convenceu. O NCIS gostei muito, demais, da primeira temporada, gostei menos da segunda, achei a terceira um desastre (virou comédia pastelão!) e não consegui assistir as demais. Sei que faz um enorme sucesso, mas comigo não funciona, uma pena, uma série a menos para assistir. Agora, o Flashpoint tou marcando mosca. ainda não assisti nenhum episódio, sua indicação me deu mais vontade, vou ver. VAleu! grande beijo

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